sábado, 12 de março de 2022

Barbárie institucionalizada, razão de toda guerra no filme "O Poço"

Por Dâmaris A C Melgaço

O filme, "O poço" nos apresenta uma perspectiva polarizada, de possibilidades restritas às determinações do funcionamento territorial. Os homens adentram a ele como elementares, mas nunca são permanentes. Eles viajam pelas estruturas do sistema funcional do poço como escravos. A depender de sua habilidade estratégica dentro da prisão, sobem ou descem às camadas de territórios existenciais.

No entanto, o poço não valida suas próprias leis e a priori garante uma certa preferência de indivíduos em detrimento a outros, que embora possuam habilidades estratégicas são excluídos de alguns territórios. Há no poço os inconformados, os revoltados e os altruístas. Estes por sua vez caminham entre territórios, a fim de destruir as algemas do sistema funcional do poço. 

Todos os envolvidos buscam sobreviver, alguns individualmente, outros coletivamente, porém ao ignorar os condicionamentos do poço eles sofrem as consequências da ajuda não solicitada. 

Percebe-se nesta base funcional que a barbárie é acionada e quanto menor a escassez maior a barbárie, porém a barbárie vista apenas desta forma parece maquiar a barbárie existente dentro da forma existencial do poço, já que ela constitui-se a premissa básica daquele sistema funcional. O interessante é que há uma tentativa de justificar a violência existente dentro daquele território existencial, como se o rigor da barbárie física pudesse superar a barbárie funcional.

Em nome do bem comum, vale o terror, vale a espada, vale a morte do outro. Esquecem que todos estão no poço, aprisionados ao sistema funcional daquele território existencial. Desde as camadas mais altas, cuja provisão garante a sobrevivência, às mais baixas, cuja escassez garante a barbárie física. Parecem esquecer que são, em suma; indivíduos existentes naquela prisão, cuja cegueira das suas mentes garante o funcionamento do poço.  

No poço não há janelas e não há quem pense criá-las. Todos só pensam nas camadas, todos pelejam nas estruturas, todos só vêem o que desejam ver através de suas lentes condicionadas. Não há um louco para romper as lentes. Não há um louco para criar janelas. Todos condicionados a sua gênese animal, evocando a barbárie física contra um fosso desigual que eles mesmos criaram.

As lutas por territórios são e continuam sendo as rendas do sistema que tem sua gênese na necessidade instintual humana de ser o líder do bando e deter o poder. As guerras são a expressão dessa gênese. A luta pela imposição de um novo sistema funcional, a meu ver; é tão alienante quanto este, cuja mão de ferro regerá as vidas. De escravos a escravos melhor remunerados.

Enquanto a humanidade insistir na mercadorização da existência e da natureza, pela ostentação da moeda e do lucro, a vida será somente uma possibilidade: barbárie. E sinto muito informar que boas intenções não salvam o sistema e nem os que dele fazem parte. Não salvam os detentores do poder, porque à eles nada falta, nem tão pouco os que nada têm, porque estes precisam sobreviver e encontrar formas mecânicas de fazê-lo.





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