sábado, 10 de agosto de 2024

CARTA PEDAGÓGICA À QUESTÃO AGRÁRIA BRASILEIRA E AOS SEUS DESDOBRAMENTOS NA EXISTÊNCIA INDÍGENA YANOMAMI

Fonte: Disponível em: https://www.poder360.com.br/poder-governo/governo/governo-lula-ainda-nao-atualizou-dados-sobre-yanomamis-em-2024/. Acesso em 10 ago. 2024.


Dâmaris Alcídia da Costa Melgaço[i]

Faculdade de Educação da Unicamp 

Resumo: O objetivo geral desta carta pedagógica é discutir teoricamente os desdobramentos da questão agrária na existência da população indígena Yanomami. Para tanto, fez-se pesquisa bibliográfica em plataforma digitais e livros, a fim de reunir argumentos teórico-científicos na tentativa de responder duas questões básicas: 1). Qual a relação entre a questão agrária brasileira e as insistentes invasões territoriais em espaços geográficos indígenas? 2). Por que os seres humanos se autodestroem nas relações sociais, mantendo em sua prática ações violentas sobre culturas diversas? Esta carta pedagógica auxilia na ampliação das reflexões acerca de processos libertadores da humanidade, cuja força vem do coletivo, numa práxis freiriana. Abre espaços de diálogo com a materialidade histórica dos homens e suas consciências, cujo objetivo é a libertação de suas mentes e a reapropriação de seu arcabouço histórico-cultural e de sua produção material.

Palavras-chaves: Reforma Agrária; Etnia; História e Sociedade, Capitalismo Dependente; Práxis Freiriana.

INTRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO 

Nos recônditos do espírito escrevi versos que me pesaram, outros que me confrontaram e outros que me libertaram. Todos eles eram caminhos possíveis. (Dâmaris Melgaço)

Dou início a esta carta pedagógica enfatizando a frase acima citada, a mim – muito peculiar. Afinal, discursar sobre as diferenças é sempre uma possibilidade reflexiva, sendo também uma oportunidade de levar outros seres a trilharem o caminho da reflexão, bem como uma oportunidade de nos concatenar a Paulo Freire em “A Pedagogia do Oprimido” quando afirmava que:

Será na sua convivência com os oprimidos, sabendo-se também um deles – somente a um nível diferente de percepção da realidade -, que poderá compreender as formas de ser e comportar-se dos oprimidos, que refletem, em momentos diversos, a estrutura da dominação. (Freire, 2021, p.67). 

É sabido, caro leitor, que desde a transição governamental brasileira ocorrida em janeiro de 2023 - na gestão Lula/Alckmin -, emergiram na mídia casos de exploração do garimpo em terras indígenas Yanomamis, sendo estas questões, já; anteriormente dadas e denunciadas, porém não consideradas em maior ângulo na política de base ultraliberal bolsonarista. Juntos ao caminhante da obviedade[1], podemos refletir que a questão agrária aqui exposta -, está para além das políticas de interesses partidários. Ela se alicerça nas bases estruturais da sociedade brasileira, que determinam nossas condições culturais, sociais, políticas e econômicas, não isentando nenhum governo.

Notícias anteriores aos movimentos do novo governo davam conta de que em abril de 2022, uma mulher e uma criança de três anos haviam sido levados por garimpeiros, ficando a criança na posse dos agressores. Outra notícia expôs um vídeo, cuja denúncia apontava o senador Messias de Jesus como um militante do garimpo ilegal e da mineração em terras indígenas, fechando os olhos para os embates mortais existentes entre garimpeiros e indígenas[2]. Fato é, que embora tenham sido feitas denúncias aos órgãos competentes - Polícia Federal e Ministério Público Federal – nada pôde ser feito, pois o local, cuja ocorrência efetuou-se, estava vazio e destruído por chamas. Quando em contato com os indígenas sobreviventes, nada se pôde obter, pois os mesmos foram silenciados por uma boa quantia[3]. O silenciamento dos inocentes, amigo leitor, é a arma fatídica de sua morte.

Relatórios realizados pelo CIMI - Conselho Indigenista Missionário[4]- apontam que no período de 1995 a 2005 ocorreram 287 assassinatos de indígenas no Brasil, sendo 165 no governo FHC – Fernando Henrique Cardoso (1995/2002) – média de 20,65 por ano e 122 no governo de Lula (2003-2005) – média de 40,67 por ano. O relatório, divulgado pelo CIMI em 2022, expõe claramente aumento das violências contra povos indígenas no governo Bolsonaro (2019-2022), contabilizando - em 2021 – 355 casos de violências contra eles, sendo destas; 176 casos de assassinato. Este relatório clarifica a posição mais radical deste governo em 2021, cuja política foi a manutenção da estagnação de demarcações territoriais indígenas e de omissão protetiva às terras já demarcadas. “A consequência dessa postura foi o aumento, pelo sexto ano consecutivo, (grifo meu) dos casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio”” (CIMI, 2022, p. 8). O que denota que esta política vêm de anos anteriores, porém atualmente mais agravada.

Embora esse alto índice de violência seja resultante de uma somatória de vários fatores, é sem sombra de dúvidas a questão fundiária a causa principal. A Política Indigenista Brasileira sempre atrelou a demarcação de terras indígenas aos interesses de terceiros sobre as terras e as riquezas nelas existentes (Feitosa, 2006, p. 13).

A partir dessas reflexões, quero eu tornar esta conversa dialógica, abordando algumas questões importantes e; que - a meu ver -, devem ser discutidas no atual cenário social, econômico e político no Brasil, sendo uma delas a relação entre a questão agrária brasileira e as insistentes invasões territoriais em espaços geográficos indígenas, para uma maior exploração das fontes naturais existentes nessas áreas.

Esse convite à reflexão, torna-nos companheiros na exploração dinâmica das variáveis que determinam esses processos e; é claro, não o faremos sozinhos, mas acompanhados por outros pensadores, que muito tem se debruçado na busca do desvelamento dos fenômenos sociais aparentes. Um deles é o pesquisador Florestan Fernandes (1920-1995), que se dedicou a estudar o processo da revolução burguesa no Brasil, respeitando os aportes históricos e sociais, que embasam as estruturas econômicas brasileiras e que determinam o tipo de capitalismo regente por aqui: o capitalismo dependente[5].

Não podemos nos esquecer que o Brasil teve a sua gênese sobre os princípios da contrarreforma e da exploração de novas terras, matriz portuguesa. O período colonial/escravista e; depois, o período republicano deram as bases da exploração pré-capitalista[6]. O Brasil nutria dentro de si a cultura da exploração e subserviência, que alimentava algumas famílias abastadas, sendo estas, o gene da oligarquia de interesses. Como caminhantes da obviedade, podemos compreender que até a ocorrência dos movimentos de industrialização tardia, ocorrida nos anos 50, o Brasil era uma nação, cuja matriz era rural ou campesina (Fernandes, 2006).

É fácil deduzirmos, através da teoria do capitalismo dependente, que o estudo desta formação social basal da sociedade brasileira reverbere atualmente como força antagônica nos interesses econômicos que se colocam em disputa no Brasil atual. Afinal, esta teoria - Fernandes (2006) -, disseca a fragilização social, política e econômica do capital brasileiro, agravadas pela selvageria e debilidade social percebidas desde o seu início, quando as relações de produção e entre classes sociais, ainda não carregavam a força do capital monopolista estrangeiro sobre si.

O Brasil é um país que dada sua base colonial não possuía uma burguesia em destaque em oposição à aristocracia agrária. Por ser um país do engenho, da fazenda e da estância pré-capitalista, a nação contou com o engajamento da aristocracia agrária no centro da transformação capitalista. Logo, percebido o surgimento do mercado e das novas relações produtivas, os jogos de interesses se voltaram a conciliação do poder colonial e neocolonial que garantiam o acúmulo monetário pré-capitalista e o maior lucro, próprio do capitalismo moderno. Houve, então, a junção do antigo e do moderno, “a antiga aristocracia comercial com seus desdobramentos no “mundo de negócios” e as elites dos emigrantes com seus descendentes, prevalecendo, no conjunto, a lógica da dominação burguesa dos grupos oligárquicos dominantes. ” (Fernandes, 2006, p. 247 apud Melgaco, 2022, p. 3).

Outro fator importante e essencial nessa transição é a composição sociopolítica de um país - sua origem capital. O Brasil não tem a sua origem capital a partir do sistema feudalista, mas sim a partir de uma sociedade escravocrata e este fato não é uma mera formalidade, pois economias pautadas em atividades escravistas tendem a ser estáticas e predatórias, com ausência de inovação técnica. “Por isso, o sistema de produção escravista só pode proporcionar uma base material, técnica e humana pobre ao capitalismo. ” (Saes, 2015, p. 2).

O que eu quero evidenciar nesta carta, caro leitor, são as artimanhas extrativistas da política econômica brasileira, que ainda se ampara na conciliação das classes via assistencialismo, como armadilhas postas à classe trabalhadora, que - geralmente iludida -, se coloca escrava de atividades ilegais e deletérias, sob penas de uma eminente destruição de si mesma. Logo, a partilha entre a questão agrária e a questão da existência indígena Yanomami se correlacionam via economia política. Sabemos que países subdesenvolvidos, como o nosso, sofrem uma grande pressão por parte dos países dominantes economicamente, principalmente sobre a questão agrária, pois esta está sob o domínio das estatais estrangeiras.

Este domínio controla a produção de base agrícola e tornam potentes as violências oriundas do capital, estendendo-as sobre os trabalhadores do campo e da cidade. Caldart (2009) expõe que essas violências se dão de formas distintas no Brasil e em contradição. Elas possuem uma mesma lógica estrutural, cuja intenção é expulsar o trabalhador rural do campo para incluí-lo na modernidade tecnológica, via indústria do agronegócio, que contraditória à promessa da inclusão, os mantém em escravidão. Portanto, este ataque desvela as contradições existentes dentro do sistema capitalista, que se caracterizam simultaneamente como social e ambiental, já que implicam de forma direta no futuro da espécie humana e de todo o seu meio ambiente em relação à sua sobrevivência.

Pode-se compreender, então, o porquê desses avanços violentos sobre os territórios indígenas e a sua dizimação, afinal as forças concorrentes dentro da economia exigem cada vez mais a exploração das terras através da expropriação, com o fim último da mais-valia (maior lucro), próprios do capitalismo monopolista[7], cujo surgimento no Brasil se dá no século XIX à década de 1950. O monopólio extrativista está nas mãos das economias centrais e cabe às sociedades marginais/periféricas garantirem manufatura, bem como a matéria-prima em sistema de commodities[8].

Pois é, adentramos mais intensamente na questão do agronegócio e este por sua vez está cada vez mais imbricado na consolidação do capital. Desta maneira é um grande produtor de guerra cultural/ideológica. Caldart (2009) informa que a indústria do agronegócio age na contramão dos movimentos sociais e da reforma agrária e promovem a falsificação da liberdade com promessas de resolução dos grandes latifúndios, pois aponta para a produção alimentícia e a expansão das divisas nacionais. Os donos de empresas se colocam em luta contra toda forma de luta emancipatória dos homens, espalhando mentiras sobre os movimentos de luta de classes. Isso é intencional, já que os mesmos precisam da ampliação da exploração e eles sabem que os movimentos sociais de luta são uma via resistente a esse modo de produção inerente ao capital. Ora, eles sabem que ao tornarem-se conscientes da exploração ambiental desmedida e suas consequências prejudiciais, setores sociais e de resistência se colocariam contra esta indústria e sua lógica de produção e; pior ainda, contra as tensões promovidas por este tipo de modelo econômico.

Paulo Freire (1921-1997) é essencial nesta conversa, caro interlocutor, pois ele foi um grande expoente da luta no campo, em especial na reforma agrária chilena. Muitos o interpretam de forma errônea, muitas vezes o tratando como um poeta sonhador. Seus escritos estão intimamente situados a sua própria experiência, a de um exilado. Nossa conversa torna-se neste instante mais humana e interessante. A questão que se levanta neste instante é: por que os seres humanos se autodestroem nas relações sociais, mantendo em sua prática ações violentas sobre culturas diversas? Juntamente com Freire e seus escritos tentaremos responder esta questão.

Dois livros são fundamentais para entender com lucidez a proposta sociopedagógica deste autor, Pedagogia do Oprimido, redigido no contexto da Reforma Agrária Chilena [1962-1973] e Educação como Prática da Liberdade. Percebe-se neste autor sua humanidade refletida pela busca de uma pedagogia libertadora das massas populares. Defensor da alfabetização, pode-se dizer que deu a ela o sentido de “Aprender a escrever a sua vida como autor e testemunha de sua história, isto é, biografar-se, existenciar-se, historicizar-se.” (Fiori, 2021 apud Melgaco, 2022, p. 6).

Freire (2021) em suas palavras introdutórias chama a atenção do leitor para que o mesmo faça uma abertura de sua consciência para além de suas crendices populares, ele impulsiona o diálogo de caráter transformador através da dialogicidade[9] como ferramenta capaz de transmutar o pensamento oprimido. Para este autor o fanatismo não é senão o retrocesso da consciência, porém a radicalização processual o caminho para que os homens reassumam a sua historicidade e o processo da criatividade produtiva que dá sustentação ao pensamento crítico. A dialogicidade não é um processo passivo diante de mecanismos opressores, mas uma possibilidade que se abre para a totalidade e a racionalidade, não impedindo a comunicação. “Se a sectarização, como afirmamos, é o próprio do reacionário, a radicalização é o próprio do revolucionário” (Freire, 2021, p. 37).

Caminhando obviamente com Freire (2021) podemos refletir que a relação do homem oprimido com a sua própria história é uma de suas preocupações, tanto que ele propõe que seja estabelecido dialogicidade entre o conhecimento popular e o conhecimento histórico acumulado pelos homens transmitidos pela escola. Desta forma, ele propõe a valorização dos homens e suas culturas, sendo contrário a verticalização da verdade. Ele acredita que através da ruptura conceitual – e isto é filosófico - os homens podem refletir a sua gênese, desvelando processos próprios da colonização, tão característicos à nossa própria realidade histórica, que em tempos modernos e; simbolicamente, têm colonizado também as mentes e o pensamento humano, caracterizando alienação do homem à sua própria produção histórica via trabalho e cultura.

Freire é importante para se pensar a questão agrária, visto que ele ficou imerso e participante na reforma agrária chilena, bem como as questões territoriais dos povos étnicos, pois sua teoria é uma teoria que pensa a prática humana que liberta os homens da opressão (Melgaco, 2022, p. 7).

Freire (1968) apud Vasconcelos (2020) explica que travou batalhas difíceis no Chile, principalmente na relação escolar dos trabalhadores rurais junto ao funcionalismo público setorial, que notoriamente se irritavam com a demora de seu método na obtenção de resultados no sistema produtivo, em detrimento às especificidades do trabalhador rural. Sua resposta viera com respeito ao universo cultural destes trabalhadores, afinal para ele a produtividade no processo de reforma agrária estava muito acima daquilo que a circundava, era cultural e; portanto, o aumento da produtividade jamais deveria ser olhado como uma instância separada daquilo que é universal ao contexto cultural dos trabalhadores.

Foi debatendo junto aos especialistas chilenos que Freire (1968) desenvolveu muitos de seus estudos teóricos, entre eles, a teoria da invasão cultural, cultura do silêncio e ação antidialógica. Para ele o latifúndio é uma base estrutural vertical e fechada em seus estratagemas, sendo por si mesma antidialógica. Logo, uma forma de romper o silêncio dos trabalhadores rurais, descobrindo suas causas, seria mediante um diálogo que se propusesse problematizador (Vasconcelos, 2020).

Nessa ação dialógica que, aqui e agora, estabelecemos nesta carta pedagógica, nós podemos - com outros - repensar a ação antidialógica, que ocorre nas relações de poder junto às populações indígenas. Diante dessas forças, o que se vê é o silenciamento das vozes indígenas. As estruturas sociais ora compram o seu silêncio na lei mercadológica do capital e ora retroagem com maior violência, dizimando as suas vozes e subjetividades culturais, mantendo-os na opressão e no apagamento existencial.

Para Freire (1967) quando os homens estão integrados, eles podem refletir a sua própria realidade de forma crítica e assim não se conformar a ela, modificando-a. Porém, quando os mesmos homens se encontram acomodados, eles não conseguem refletir a sua própria condição histórica, indo se moldando aos sistemas já impostos por outros homens. Dessa maneira eles não escolhem e apenas se ajustam ao já existente. O homem sujeito é um ser que está comungado e que é agente na natureza, transformando-a. Esse tipo de homem é automaticamente revolucionário, já que age contra as lógicas do mercado, ganhando a alcunha de subversivo.

Este autor continua defendendo que a grande luta dos homens é o não ajustamento, que pode ocorrer pela suplantação de variáveis que levam os homens a viverem o processo da acomodação. Trata-se uma luta humanitária, que sofre a todo tempo o impingimento de forças opressoras, várias vezes com a aparência de libertação. Afinal, na era da modernidade, o homem paga um alto preço por sua escolha e acaba sob o domínio das religiosidades, das fake news, cujo teor geralmente contém uma ideologia, o que os faz abandonarem o seu livre-arbítrio ou a sua autonomia decisória. Toda a atividade humana acaba sendo gerenciada por uma classe dominante, que outorga aos trabalhadores uma cartilha em forma de receita, um passo a passo de como agir, fazer, viver e existir. A armadilha está, que enquanto esses homens pensam estar sendo libertos de suas mazelas, eles, na verdade, estão sendo submersos na inexistência por uma mente massificada. A esperança e a crença para esses homens já não existem, estando eles mercadorizados e domesticados pelo sistema à configuração de um não-sujeito. “Daí que a massificação implique no desenraizamento do homem. Na sua “destemporalização”. Na sua acomodação. No seu ajustamento” (Freire, 1967, p. 42).

Freire (1967) continua: é preciso que se evidencie a atitude crítica como uma necessidade duradoura, pois esta é a única maneira em que o homem exercerá a sua disposição natural para a integração, podendo libertar-se da ação acomodada e ajustada. Este homem pode abarcar com profundidade novos temas e atividades de seu tempo. A integralização dá as bases radicais dos homens, dotando-lhes de historicidade e situando-os dentro das condições sociais que os cercam, porém, quando estes estão ajustados/acomodados não se reconhecem como homens históricos, tendo-se tornado homens das massas, seres tratados ou expressos em termos gerais.

Para finalizar a nossa conversa retomo as palavras de Freire (2021) em “A pedagogia do Oprimido”: a tendência social será sempre olhar para a resposta dos oprimidos de forma reprovável, já que esta resposta pode ser vista como uma atitude rebelde e violenta. No entanto, trata-se de uma atitude preenchida de amor, já que pode libertar o opressor. Ora, o opressor não tem consciência de que a violência que comete é contra ele mesmo, porque quando impede o outro de existir, também impede a si mesmo de ser autêntico. Portanto, aqueles que sob opressão se rebelam contra seus opressores, retiram de suas mãos o poder da destruição, lhes devolvendo a chance de restaurarem a humanidade perdida na utilização da opressão.

Gosto de pensar assim, caro leitor, que o amor está para além da utopia, é palpável e material. Não vem carregado de aforismos e essências românticas que distanciam amor e ódio. Na verdade, os aproximam enquanto potência, fazendo-os caminhar entre polos de afeto, devolvendo à vida humana o seu equilíbrio. Por mais amor freiriano, por mais gentes como a gente, por mais liberdade e acima de tudo por mais luta – toda forma - em respeito às existências. Se é que me entendem!

Com meu carinho e compromisso ético.

 

Subscrevo-me,

Campinas, 10 de agosto de 2023.

 

REFERÊNCIAS

 

CALDART, R. S. Educação do campo: notas para uma análise de percurso. Trab. Educ. Saúde, Rio de Janeiro, v. 7 n. 1, p. 35-64, mar./jun., 2009. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tes/a/z6LjzpG6H8ghXxbGtMsYG3f/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: nov. 2022. 

CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Invasões de terras indígenas tiveram novo aumento em 2021, em contexto de violência e ofensiva contra direitos. Publicado em 16 de agosto de 2022. Disponível em: https://cimi.org.br/2022/08/relatorioviolencia2021/#:~:text=A%20consequ%C3%AAncia%20dessa%20postura%20foi,em%2022%20estados%20do%20pa%C3%ADs. Acesso em 10 ago. 2024.

CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil: Dados de 2021. Brasília: CIMI, 2022. Disponível em: https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2022/08/relatorio-violencia-povos-indigenas-2021-cimi.pdf. Acesso em: abr. 2023.

FEITOSA, S. A década da violência. In: CIMI – Conselho Indigenista Missionário. A Violência contra os povos indígenas no Brasil: 2003-2005. Brasília: CIMI, 2006. Disponível em: https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2020/02/relatorio-violencia-contra-povos-indigenas_2003-2005-cimi-completo.pdf. Acesso em: abr. 2023.

FERNANDES, F. A Revolução Burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica (Cap. 5, 6 e 7). 5 ed. São Paulo: Globo, 2006.

FIORI, E. M. Prefácio. In: FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 79 eds. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021. 

FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

FREIRE, P. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. [Ebook online]. São Paulo: Editora UNESP, 2000

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 79 eds. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021.

MELGACO, D. A. C. A questão agrária e as suas implicações na existência indígena Yanomami. Jornal A Tribuna, São Paulo, 31/12/2022, Artigos Científicos. Disponível em: https://jornaltribuna.com.br/2022/12/a-questao-agraria-e-as-suas-implicacoes-na-existencia-indigena-yanomami/. Acesso em 10 ago. 2024

OLIVEIRA, I. A. de. A dialogicidade na educação de Paulo Freire e na prática do ensino de filosofia com crianças. Movimento-Revista de Educação, Niterói, ano 4, n.7, p.228-253, jul./dez. 2017. Disponível em: https://periodicos.uff.br/revistamovimento/article/view/32633. Acesso em: 10 ago. 2024

SAES, D. A. M. Capitalismo e processo político no Brasil: a via brasileira para o desenvolvimento do capitalismo. Revista Novos Rumos, [S. l.], v. 52, n. 1, 2015. DOI: 10.36311/0102-5864.2015.v52n1.8481. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/novosrumos/article/view/8481. Acesso em: 10 ago. 2024.

VASCONCELOS, S. J. "O lápis é mais pesado que a enxada": reforma agrária no Chile e pedagogias camponesas para transformação econômica (1955-1973). 2020. 495 f. Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8137/tde-13042021-193600/publico/2020_JoanaSalemVasconcelos_VCorr.pdf. Acesso em 10 ago. 2024. 

VEIGA-NETO, A. Cultura, culturas e educação. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, n. 23, p. 5-15, ago., 2003. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbedu/a/G9PtKyRzPcB6Fhx9jqLLvZc/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 10 ago. 2024.

VERÍSSIMO, M.P.; XAVIER, C.L. Tipos de commodities, taxa de câmbio e crescimento econômico: evidências da maldição dos recursos naturais para o Brasil. Rev. Econ. Contemp., Rio de Janeiro, v. 18, n. 2, p. 267-295, mai./ago. 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rec/a/GzXNXQBDtbmqwVxhLRwY6Tj/?format=pdf. Acesso em 10 ago. 2024.



[1] Canção óbvia foi escrita por Paulo Freire em 1971. Um poema que chama os homens a ação: “Quem espera na pura espera vive um tempo de espera vã. Por isto, enquanto te espero trabalharei os campos e conversarei com os homens ...” (Freire, 2000, l. 06).

[2] Disponível em https://www.instagram.com/p/Ccy9OTHF7l0/. Acesso em: 01/12/2022 e https://www.instagram.com/p/CcTIdHylAar/. Acesso em: 01/12/2022.

[3] Disponível em: https://www.instagram.com/p/Cc8NfgkOx86/. Acesso em: 01/12/2022.

[4] O Cimi é um órgão vinculado a CNBB e há 49 anos vem atuando na defesa da população indígena brasileira. Disponível em: https://cimi.org.br/. Acesso em: abr. 2023.

[5] Um país capitalista dependente é aquele que está sob o comando dos interesses de outro país mais desenvolvido economicamente, cujo poder determinará como as relações de produção se darão internamente para satisfazer aos seus interesses. Em contrapartida, o governo de um país dependente se aliará aos interesses deste país, detentor do poder hierárquico e proporcionará todas as condições para que este processo ocorra, garantindo a segurança nacional, sendo desta maneira mais condescendente para com as indústrias internacionais e mais agressivo – internamente -, para com os seus trabalhadores (Conceito formulado a partir da leitura de Fernandes, 2006).

[6] Portanto a transição para o capitalismo brasileiro acontece em dois momentos distintos, caracterizando a nossa revolução burguesa: 1) a abolição da escravatura em 1888, 2) a proclamação da república em 1889, finalizando com a superação da atividade industrial sobre a atividade agrícola no final da década de 50 (Saes, 2015).

[7] Este tipo de capitalismo ocorre quando o capital e o mercado ficam sob o domínio de um grupo reduzido de indústrias. A explicação para tal fato se localiza na redução da concorrência, quando uma indústria maior compra as menores. Desta maneira, uma única estatal abocanha a maior parte do mercado, ganhando maior controle (Conceito formulado a partir da leitura de Fernandes, 2006).

[8] Produtos alimentícios, matérias-primas, minerais e energia e se relacionam com taxa de câmbio e crescimento econômico. “A literatura sobre a "maldição dos recursos naturais" (...) parte do pressuposto de que as economias ricas em recursos naturais tendem a apresentar menores taxas de crescimento econômico” (Veríssimo; Xavier, 2014, p.  269).

[9] “Na teoria dialógica freireana, o diálogo, que é comunicação, funda também as ações de colaboração entre os sujeitos” (Oliveira, 2017, p. 250).



[i] Mestrando em Educação, FE/Unicamp. Especialista em Educação Especial, Unimais. Graduada em Pedagogia, Ices; Graduada em Psicologia, Unip. Contatos: e-mail: d197129@dac.unicamp.br e damarismelgaco@gmail.com; telefone (35) 991896502.

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