1. O que é o conceito de “apropriação” segundo Smolka e qual a diferença possível que pode ser feita em relação ao conceito de “internalização”?
2. Descreva o processo de apropriação e significação na perspectiva histórica cultural e qual é o papel da linguagem nesse processo?
QUESTÃO 1
Para Smolka o termo
apropriação teria um caráter de interiorização, pois ela considera que apropriação e internalização poderiam
ser termos utilizados como sinônimos
equivalentes porque ambos supõem “[...] algo que o indivíduo toma 'de fora'
(de algum lugar) e de alguém (um outro) [...]”, implicando “[...] a ação de um
indivíduo sobre algo ao qual ele atribui propriedade particular.” (Smolka,
2000, p. 28). “Em incorporação e interiorização, a ênfase está no ambiente de
chegada do objeto deslocado: espaço interno de alguma coisa” (Batista, 2018).
“Em latim, interior
significa íntimo, recôndito. Dessa forma, podemos entender interiorização como
um processo de internalização, situação em que algo exterior é tornado íntimo e
interno.” (Costa & Santa-Clara, 2015).
A apropriação pode também
ser entendida como algo que vem de
fora. Essa expressão “[...] pode ser compreendido e/ou referido de
várias maneiras: como uma informação; a ajuda de um parceiro; a escuta de um
ouvinte, ou um coprodutor da mensagem; uma ferramenta instrucional etc.” (Costa
& Santa-Clara, 2015).
Apropriação para Vigotski
é entendida “como a pedra angular do processo de elaboração das funções
psíquicas superiores, [...], como resultado do processo que permite a inserção
da criança como copartícipe da cultura.” (Costa & Santa-Clara, 2015).
Segundo ele “a criança, primeiramente, internaliza o legado cultural, passando
a ser um agente de modificação dessa cultura, podendo intervir nela por meio de
sua ação” (Costa & Santa-Clara, 2015).
“O conceito de
internalização aparece em meio às discussões da criação das funções psíquicas
na criança, posto pelo autor nas seguintes palavras: “chamamos de
internalização a reconstrução interna de uma operação externa.” (Vigotski,
1984, p.74 apud Costa & Santa-Clara, 2015).
A questão entre a
apropriação e a internalização é investigada em Rogoff (1990, 1987, 1995, 1998)
que, em seus escritos, aponta como
diferença entre os termos o fato de que a
internalização remonta a Vigotski (1984, 1987, 2001) que deixa em seus
escritos uma falta de explicação satisfatória em relação ao que, de fato, esse
conceito significa.
Como, na
verdade, ele ocorre? O que está em jogo na seleção dos fatores que são
absorvidos e/ou relegados no processo? Ele seria um processo continuado, ou o
seu resultado? Ele implica numa certa estabilidade do fator externo que passa a
ser um fator interno? E quando passa? Ou o fator internalizado continua em
movimento contínuo, mesmo diante do fato de estar internalizado? Rogoff (1990,
1987, 1995, 1998), baseada nos trabalhos vigotskianos, argumenta que a
internalização, como é pensada pelo autor, implica num certo movimento de
transformação onde, primeiro, ocorre um momento social e coletivo, e
posteriormente, um momento individual como ponto de chegada (COSTA &
SANTA-CLARA, 2015).
É pensada como o
resultado de uma atividade, envolvendo uma passagem do coletivo para o
individual. [...] Significa um processo no qual não existe uma passagem de algo
externo para dentro, mas um movimento de forma contínua, mesmo porque não se
pode delimitar exatamente o que está fora e dentro da mente [...] o individual
e/ou coletivo. Resumindo, a apropriação ocorre na atividade (Costa &
Santa-Clara, 2015).
QUESTÃO 2
A translinguística
requer a consideração de uma linguagem que se utiliza de um aparato reiterável,
estrutural e, ao mesmo tempo, requer a consideração da intenção do sujeito que
povoa o discurso e, dessa forma, torna-se o autor, emergindo em singularidade e
também em diferenciações progressivas
Salienta o sentido dado
ao termo pelo citado autor, significando o processo de tornar minhas as
palavras do outro, que permite o diálogo e o processo de apropriação como
contínuo e complexo.
Processo
dialógico-argumentativo, ou seja, como algo que não possui existência a priori,
mas se desenvolve no decurso das negociações significativas entre o sujeito e
os diferentes outros/vozes sociais. A apropriação trata-se, portanto, de um
processo cuja existência só é possível a partir de um discurso interior
imbricado em relações sociais.
A translinguística faz
uso da significação, caráter estrutural reiterável toda vez que é enunciada, e
do sentido, caráter circunstancial que se apresenta compreensível diante de uma
situação que possui um sentido de acabamento, permitindo a compreensão da
intenção individual do falante. O limite entre o interno e o externo, entre o
meu ponto de vista e o ponto de vista de outrem, tem de ser analisado com base
no diálogo dentro de uma atividade prática, local e específica.
Diferente da atividade
informal de ensino, em que a criança aprende de forma espontânea, a atividade
de sala de aula se caracteriza como uma atividade formal, onde o ensino passa a
ter um papel instrucional fundamental que faz parte do arcabouço secular da
humanidade. Enquanto atividade eminentemente pedagógica, o ensino formal se
passa em um lugar particular onde existem normas que devem ser seguidas pelos
estudantes, uma linguagem própria a ser apropriada, não somente relativa ao
conteúdo, mas também à comunicação,
Tanto na concepção de
Leontiev (1978) quanto na de Vygotsky (2008), na relação com os objetos do
mundo, o sujeito fica diante de um problema a resolver; esse problema não é
apenas seu, mas de todos. Entretanto a forma de lidar com os objetos do mundo,
embora diga respeito a todos, é particular e intransferível, pois a produção de
significado que ocorre nessa relação se estabelece a partir do repertório
cultural de cada sujeito. Nesse contexto, o “tornar seu” não significa “tomar
posse” de alguma coisa, mas adquirir “seu modo próprio” de perceber e de lidar
com as coisas do mundo.
No processo de
apropriação do espaço, o sujeito ou o grupo estabelece uma relação de
identidade e de pertencimento que transforma o ambiente como uma expressão de
si. Nessa relação, tanto o sujeito pode pertencer ao espaço quanto o espaço
pode, simbolicamente, pertencer ao sujeito. É uma relação de domínio afetivo do
espaço, no qual são exercidos controle e posse simbólicos.
REFERÊNCIAS:
COSTA,
Eveline Vieira; SANTA-CLARA, Angela. Apropriação
como Produção Coletiva na Atividade e Internalização como Resultado desta
Atividade: um exemplo de álgebra elementar na sala de aula. Bolema, Rio
Claro (SP), v. 29, n. 51, p. 349-368, abr. 2015.
VIGOTSKI,
L. S. A formação social da mente.
Tradução: J. Cipolla Neto; L. S. M. Barreto; S. C. Afeche. São Paulo: Martins
Fontes. 1984.
BATISTA,
Carmem Lucia. Os conceitos de
apropriação: contribuições à Ciência da Informação. Em Questão, Porto
Alegre, v. 24, n. 2, p. 210-234, maio/ago. 2018 Disponível em: http://dx.doi.org/10.19132/1808-5245242.210-234.
SMOLKA,
A. L. B. O (im)próprio e o
(im)pertinente na apropriação das práticas sociais. Cadernos Cedes,
Campinas, v. 20, n. 50, p. 26-40, abr. 2000.
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